Não poderia deixar de abordar um tema que se tornou obrigatório: as sucessivas vítimas de balas nas comunidades carentes, dessa vez se concentrando sobre menores. Isso nos choca profundamente e mostra que a política de segurança pública que excita o confronto não vai nos levar a lugar algum.
O governador do Estado está excitando o abate. Esta é uma palavra que jamais tinha ouvido qualquer governador utilizar em política de segurança pública. O termo já diz tudo: abater é derrubar a pessoa de forma definitiva, quando a ordem e o critério de um policial – ele aprende isso desde que entra para a sua unidade – são prender o criminoso com vida, e não abatê-lo, porque não existe pena de morte no Brasil.
Quando se tem a política de abate, evidentemente, aqueles que moram em comunidades carentes começam a ser vitimados e o próprio policial fica numa situação de grande dificuldade, porque carrega com ele também o drama psicológico de ter atirado e acertado num inocente. Não são insignificantes os números de policiais que têm distúrbios psíquicos. Além do mais, a posteriori serão submetidos a inquéritos e julgamentos.
Não se faz política de segurança pública dando prioridade ao confronto. Ele existirá em algumas missões específicas, mas não como regra geral. O que tenho ouvido aqui é que a nova polícia irá privilegiar seguir o dinheiro, isto é, buscar quem financia o crime organizado e desorganizado; as milícias; o narcotráfico; as drogas, a compra de armas, para, com isso, começar a sufocar aqueles que, por derivação, colocam esses produtos, quer seja droga ou arma, no mercado. E a parceria com a Polícia Rodoviária Federal e com a Polícia Federal, no intuito de fazer o cerco exatamente desses grandes volumes de drogas e armas que passam pelo Estado do Rio de Janeiro para sair do país ou que aqui ficam para ser utilizados pelas diversas quadrilhas que estão instaladas?
Façamos um paralelo da gestão passada com a gestão atual, que já está para completar nove meses. O secretário Beltrame chegou a ser endeusado. Parecia uma entidade que pairava aqui no Estado do Rio de Janeiro. E muitas e muitas vezes, ao subir a esta tribuna para dizer que a política da UPP tornara-se um projeto político partidário eleitoral, muitos diziam que estava na contramão da história. Afirmava, à época, que não poderia dar certo, porque, em vez de fazerem alguns projetos pilotos, começaram a querer que fosse projeto amplo, geral e irrestrito, e não tínhamos força policial para tanto. E também não tivemos os investimentos sociais que deveríamos ter na comunidade. O governo insistiu, porque era plataforma político-eleitoral, que deu certo durante bastante tempo, mas depois desabou.
Mas e a essência da UPP – Unidade de Polícia Pacificadora? O que você entende? Que é um projeto que vai ter alguns policiais, com investimentos sociais, aquela comunidade ganharia a prestação de serviços dados a toda sociedade, e com isso deixaria de estar sob o domínio do narcotráfico. Isso seria política de Estado que, paulatinamente, seria desenvolvida. Aí essa política desabou, e vem outra política de governo cuja máxima é dizer: abate. Simplesmente, é a política do confronto, por mais que se discurse que vai juntar todo mundo para investigar, para seguir o dinheiro. A parte visível são inocentes mortos. E isso acontece um dia sim e o outro também.
Isso, para mim, não é luta ideológica. Para mim, é termos a percepção do que é melhor para a nossa sociedade. O nosso policial está sob comando, sob orientação, e vai cumprir o comando e a orientação que tiver. E fica preso numa profunda contradição. Afinal, na hora em que acontece o óbito, a sociedade vai em cima de quem? Do policial que está na ponta, e não dos que estão acima dele. Portanto, temos uma política que não serve ao policial, nem à sociedade.