Precisamos discutir o Regime de Recuperação Fiscal, que tem sido manchete na mídia, para fazer alguns esclarecimentos. Primeiramente, qual é a composição do Conselho de Supervisão Fiscal do Regime de Recuperação Fiscal? O Conselho é formado por três pessoas, indicadas, respectivamente, pelo Tesouro Nacional, pelo Tribunal de Contas da União e pelo governo do Estado. Qual é a tarefa dos mesmos? Acompanhar, diariamente, o Regime de Recuperação Fiscal no que se refere a suas metas e ao comportamento de cada uma. Aí incluem-se receitas e despesas e o impacto que decisões governamentais, entendidas como decisões de todos os poderes, estão tendo, positiva ou negativamente, no Regime de Recuperação Fiscal. Fazem os relatórios constatando o que está acontecendo, principalmente na miudeza, quando há algum benefício que atinja o funcionário público. São questões de 100 mil reais, 200 mil reais, um milhão, mas, nos bilhões do serviço da dívida, embora nunca tenha visto relatório do Conselho, li, que tenha tocado em 13 bilhões de reais.
Tais fatos devem ser alertados às autoridades governamentais, para que possam ser corrigidos ou compensados. Se a correção ou a compensação não ocorrer, outro relatório será encaminhado às autoridades competentes – Tesouro Nacional, Tribunal de Contas e o próprio governo do Estado –, dizendo que o Regime não está sendo respeitado. Quem decide sobre rompimento ou não do Regime é o presidente da república, assessorado por seus ministros e, evidentemente, discutindo com o governador do Estado do Rio de Janeiro e seus secretários.
Lembrando que o Regime de Recuperação Fiscal foi assinado em setembro de 2017 para vigorar por três anos, renováveis por mais três. Naquele Regime de Recuperação Fiscal, que derivou de duas leis complementares – uma federal e outra estadual -, o governo do Estado e a União pactuaram diversas metas que o Estado deveria cumprir para sair da crise.
A União entrou, unicamente, com a suspensão do pagamento da dívida nos primeiros três anos. Este foi o grande favor que a União fez ao Estado do Rio de Janeiro! Ressalvo que essa dívida jamais foi auditada. O que é grave. Uma parcela das metas que o governo do Estado propôs, e a União acatou, era absolutamente improvável de ser cumprida. Os dois anos que se passaram – porque o terceiro ano terminará em setembro de 2020 -, já o demonstraram. Os Restos a Pagar subiram alucinadamente. No sexto ano, devem chegar a R$ 26 bilhões.
As reduções dos incentivos não atingiram a meta, que era fictícia, porque o cálculo das perdas dos incentivos é cabalístico. A fórmula que o Estado adota não tem qualquer fundamento científico. A venda por licitação das linhas de ônibus, ou seja, licitação das concessões de linhas de ônibus, não ocorreu no período e, se ocorrer, possivelmente só daqui a dois anos, porque a briga na Justiça está imensa. E o Poder Executivo, nessa área de transportes, principalmente de ônibus, anda lentamente.
Agora, verificou-se, e é fundamental, a necessidade de se renovar o Regime de Recuperação Fiscal, mas, se renovar nas mesmas bases em que foi assinado, o Estado só estará adiando o momento de quebrar: em vez de quebrar agora, quebrará em 2023, porque teremos que pagar 21 bilhões de serviço da dívida.
Só que diversas metas eram impossíveis de ser atingidas, como, por exemplo, a meta de redução dos Restos a Pagar, que só fez ao longo dos anos aumentar e não diminuir; a meta de redução dos incentivos fiscais; a meta de acréscimo de receitas que não sejam de royalty e participação especial, sobre a qual o governo do Estado não tem jurisdição específica – quase todos são fatos alheios à vontade do governo do Estado.
Quando se faz um acordo, considera-se que o Estado está adimplente, isto é, está em dia com suas contas. A União considerou o Estado inadimplente e calculou sobre a dívida a regra da inadimplência, taxa Selic mais 1%. Com
isso, aumentou a dívida em 13 bilhões de reais e não vejo o conselho de recuperação fiscal reclamar a favor do Estado do Rio de Janeiro. Temos reclamado sucessivamente. Se agora vamos renegociar o Regime para renová-lo, é hora de rever os pontos falhos e o Estado tem que ter outra forma de compensação. Aí, lavam as mãos: “O Estado tem que mandar um projeto de lei para a Assembleia Legislativa para rever aquele que foi aprovado em dezembro.” Não terão meu voto. Não podemos fazer revisão de tudo que o governo sancionou.
O que precisamos é que cortem 13 bilhões de reais do serviço da dívida, que são 60% da folha dos ativos de um ano, que é de 21 bilhões de reais. A União, historicamente, expolia o governo do Estado do Rio de Janeiro. Todos esses tratos que o governo do Estado fez, por exemplo, com a Petrobras, são profundamente prejudiciais ao Rio de Janeiro. O governo federal não repassa para o governo do Estado 10% do que arrecada aqui. Então, o Regime de Recuperação Fiscal não é favor, é obrigação. É sistema de compensação.
Quero só dar mais um exemplo para deixar bem clara a situação: no orçamento do ano que vem, o total da nossa receita líquida, descontadas as contribuições aos municípios derivadas das obrigações constitucionais – 25% de ICMS, 50% de IPVA, etc. –, estará na ordem de 55 bilhões. Uma conta muito simples: folha anual, 21bi de ativo; folha de inativos e pensionistas, outros 21 bi. É claro que ainda precisamos abater a contribuição patronal, a contribuição individual e até os royalties e a participação especial, mas o total da folha é esse. Se tivermos que pagar, como está hoje, 7bilhões de serviço da dívida, que já começaremos a pagar no ano que vem, não tem dinheiro para mais nada. Esses são os números!
Mas, para piorar tudo, temos um governador, Wilson Witzel, que sofre de doença contagiosa – verborragia. Pegou do presidente. Então, começa a falar que é candidato à presidência da república, como se isso pudesse ser levado a sério. Ninguém é candidato à Presidência da República três anos antes das eleições. E aí temos o presidente da república que é a própria verborragia, principalmente quando acorda e aparece em público. Ficou indignado, porque o candidato à reeleição só pode ser ele, sem opositores em seu campo político.
E, aí, começam os rumores de vendeta: o presidente, para retaliar o governador, não vai renovar o Regime de Recuperação Fiscal. Duvido que faça isso, porque acima de tudo está o interesse da população fluminense e dos mais de 400 mil funcionários públicos. A população fluminense é de 17 milhões de habitantes, que deram a ele aqui uma massiva votação, além de colocar na Alerj 12 deputados estaduais, e fez de um candidato a deputado federal o mais votado, com mais de 400 mil votos. Isso foi o resultado desse pleito. Acha que o presidente vai esmagar todo o apoio que ele teve por causa de uma intempestividade do governador do Estado? Há tantas coisas essenciais a resolver e perdemos tempo com esse tipo de debate. É triste.
Precisamos, isso sim, saber como se cortará 13 bilhões do serviço da dívida, imposta ao Estado do Rio de Janeiro unilateralmente, sem que nenhuma instituição do Estado acatasse: nem a Secretaria de Fazenda, nem a Procuradoria Geral do Estado. Precisamos, sim, saber da renegociação da
dívida, aumentando esse perfil para que não paguemos dívida, pelo menos, até o ano de 2023. São estas as questões centrais.