O deputado Luiz Paulo se pronunciou na noite desta quinta-feira (05) sobre o fenômeno das manifestações e o que elas podem representar daqui por diante.
“Disse aqui e repeti muitas vezes, (…) como é que sociologicamente deveríamos entender esse novo fenômeno das manifestações de multidão, sem liderança específica e com uma pauta bastante ampla de reivindicações, que quando vai para a rua tem esse poder imenso de transformação.
Lembro-me que procurei pesquisar e verifiquei que um autor italiano chamado Antônio Negri, que por muitos é detestado, porque na década de 80 foi o ideólogo das Brigadas Vermelhas na Itália, mas que depois, em 1999, escreveu um livro oriundo de cinco debates que ele fez com outros filósofos. Esse livro, fruto desses debates, chama-se “Império”. Nesse livro, ele mostra claramente que o império é algo hoje mais novo na sociedade e está acima do que tradicionalmente, íamos às ruas para contestar e que chamávamos do imperialismo internacional; que os Estados Unidos é só mais um país que pertence ao império globalizado. E esse império globalizado, sob a ótica marxista, tem dois fundamentos:
O poder econômico globalizado que é respaldado pelas Repúblicas. E só há uma forma de enfrentar um império: a reunião das multidões.
Até na ótica marxista se dizia: “Operários do mundo, uni-vos”. Mas esse conceito de multidão não era marxista; ele se respaldava num filósofo, objeto da admiração de todos – minha, em particular –, Spinoza. Então, quando essas multidões vão às ruas elas contestam as Repúblicas e o poder econômico. Daí essas grandes manifestações irem sempre em direção aos Palácios. ”
Luiz Paulo lembra que pós Copa das Confederações, não houve nenhuma manifestação transformadora de multidão. Passou a ser somente movimento de massa com liderança e pauta específica. E vem a questão dos mascarados.
“Aí, mais do que nunca, veio à tona a questão dos mascarados, muitos depredando o bem público, o bem privado, e deixando insegurança no ir e vir das pessoas.
Ora, em sã consciência não se pode haver um democrata neste País que não queira que o povo tenha total liberdade de se manifestar, porque só essa liberdade e só essa indignação justa é que podem acelerar um processo positivo de transformação da sociedade. Não há um que seja verdadeiramente democrata que não queira isso. Ainda mais aqueles que já passaram, como eu, dos 60 anos de idade. Fomos às ruas lutar contra a ditadura – e naquela época (…) queríamos a volta da democracia.
Todos, sem exceção, e não estou me vangloriando, dos mais importantes líderes da época, iam às ruas de rosto descoberto, e era um regime de exceção. Naquela época, para tentar controlar as manifestações, ficávamos de olho naquilo que chamávamos de provocadores, principalmente os de direita infiltrados. Muitas vezes, eles iam às assembleias gerais com as palavras de ordem as mais violentas possíveis. Então, isso tudo nós vivemos. Sabemos como as coisas acontecem.
A grande novidade é que hoje todo esse processo de se convocar grandes multidões a protestar se faz pela internet. Aí, há essa novidade dos mascarados. Ali pode haver pessoas que querem só protestar, pode haver bandidos infiltrados, pode haver outros com terceiras intenções, pode haver provocadores de direita, pode haver tudo. Evidentemente, só uma ação firme e legal é que vai separar o joio do trigo.”
Ainda se posicionou em relação ao polêmico projeto que proíbe o uso de mascaras em manifestações.
“Por isso, quando esse Projeto veio à Casa, proibindo o uso de máscaras, fizemos questão de emendá-lo, porque esse tipo penal não existe para se criminalizar aquele que usa máscara. Se o tipo penal não existe e não podemos legislar sobre Código Penal, sobre Código Civil, sobre nenhum Código – isso é tarefa do Congresso Nacional – e nem o Congresso Nacional poderia fazê-lo, porque entraria em confronto com a Constituição, qual é a saída legal? Foi o que propusemos, por meio de Emendas e que, de uma forma ou outra, a Justiça decidiu, não porque propusemos como Emenda, porque isso já estava rolando lá, pois foi uma provocação do Ministério Público ao Judiciário, que é abordar o mascarado, pedir que se identifique, mostrar evidentemente sua identidade, e ver se seu rosto confere com a identidade. Se ele não estiver incorrendo em nenhum tipo penal e como se identificou, estará líber ado. Se se negar a identificar e estiver em atitude que contrarie a legislação existente, ele é levado à delegacia, para se identificar, tirar suas digitais e ser fotografado.
Este é um assunto que, no meu entendimento, encaminha para um caudal de regularidade. Agora, se entre esses manifestantes tem gente filiada, se está a comando de algum partido político, seja que partido for, que seja responsabilizado. Isso é claro, não importa que partido, se é Governo, esquerda radical, se é de centro-direita, ou social democrata, porque está confrontando as leis existentes no País. Isso também não é merecedor de grandes discussões porque é mais ou menos claro.
O importante nisso tudo, o importante mesmo, é que as manifestações possam ocorrer na maior paz possível com a capacidade de transformar. Como também eu tive muitas conversas, em especial com o Deputado Paulo Ramos, não existe democracia representativa sem partido político. A democracia direta, aparentemente, é interessante, só aparentemente; ela pode ser totalitária porque não respeita o direito das minorias. Agora, é claro que alguns instrumentos da democracia direta podem ser utilizados na democracia representativa.
Citando o Deputado Paulo Ramos, que foi Deputado Constituinte, ele mesmo seguramente aprovou a inclusão do plebiscito e do referendum, na Constituição de 88, que são instrumentos da democracia direta. Então, tem que se ter equilíbrio, nesses momentos, para buscar o caminho que leve a sociedade a avançar com responsabilidade.
Neste momento, posições extremadas não ajudam, levam às maiores distorções possíveis, mas, ao mesmo tempo, fico satisfeito que esta Casa comece a discutir questões ideológicas, partidárias, de diferença de concepção de sociedade, de concepção de forma de governar, porque o ruim é a bancada do Governo, em geral, aprovar tudo o que quer e bem entende com a resistência dos poucos moicanos que resistem. Quando esses moicanos vêm aqui e fazem críticas, essa base não defende seus governos. Não discute. Só defende e discute – algumas poucas vezes – quando as galerias estão lotadas, para poder prestar contas aos seus comandantes. Falamos comandantes do Poder Executivo.
Estou me referindo a isso, porque acho que isso é o lado bom: a intensificação dessas decisões; haver tantas opiniões díspares, quantas contraditórias, porque isso também é objetivo de uma casa Legislativa. Veja, então, que até para isso as grandes manifestações estão servindo, pois faz com que esta Casa tenha mais oradores inscritos, de tal maneira que V.Exa. nem conseguiu colocar a Ordem do Dia para funcionar como o senhor gostaria, tantos foram os apartes e as questões de ordem em relação a um tema que não estava nem em pauta. Como não estava em pauta, não podia nem ter ‘questão de ordem’. Segundo o Presidente eleito, só podia ter ‘pela ordem’.
Este é um momento importante, mas que tudo isso seja feito com respeito. Mas com a indignação real! Indignação real é aquela que vem do inconformismo e não da indignação da sátira, porque vê que o outro está numa posição difícil. Indignação não é algo que aconteça esporadicamente. Indignação tem que acontecer no cotidiano com tudo aquilo que está errado na nossa sociedade.”