Luiz Paulo comenta artigo de Serra e bebidas na Copa

Luiz Paulo comenta artigo de Serra e bebidas na Copa

Luiz Paulo comenta artigo de Serra e bebidas na Copa 1

 

O deputado Luiz Paulo, em seu discurso inicial na Alerj, comentou sobre o artigo do ex-governador de São Paulo, José Serra sobre as dividas dos estados, que são impagáveis. Aproveitou ainda para debater sobre a proibição ou não da venda de bebidas alcoólicas durante a Copa do Mundo. Vale ressaltar que o deputado já tem um projeto tramitando no parlamento, que proíbe a comercialização de bebidas alcoólicas em estádios nos municipios do Rio. Veja abaixo a íntegra do discurso.

 

“Sr. Presidente em exercício, Deputado José Luiz Nanci, Srs. Deputados, eu tenho insistido em um tema que temos que discutir e que foi objeto de deliberação na última terça-feira na Comissão de Tributação, Deputado Calazans, da qual V. Exa. faz parte: trazer aqui os Secretários de Estado para nos darem explicações, para que possamos somar forças no sentido da renegociação da dívida do Estado.

Hoje, o ex-candidato à Presidência a República, do PSDB, José Serra, fez um artigo, que saiu no Estadão, intitulado: Estados e Municípios sob extorsão. Ele mostra claramente que as dívidas de estados e de municípios, principalmente as dos municípios, são impagáveis. Enquanto a economia cresce em função do avanço do Produto Interno Bruto, as receitas são corrigidas evidentemente pela inflação, o serviço da dívida, dependendo do estado e/ou município, é TJLP + 6 ou + 9. Então, o estado ou município paga a sua dívida e sempre fica devendo muito mais do que pagou. Por isso, que é um procedimento de extorsão.

Então, primeiro, peço autorização a V.Exa. para ser transcrito nos Anais da Assembleia este artigo que é útil para todos os estados e municípios brasileiros, mas principalmente para o nosso Estado do Rio de Janeiro.

(…)

Acho que esse é um tema central, o da renegociação da dívida. Ele não está separado de outro tema que esta Casa também precisa discutir: o pacto federativo, que volta aos Anais do Congresso Nacional. Em abril, vai ter uma comissão especial de notáveis, no Senado, exatamente para rediscutir esse pacto federativo. Ora, os estados e municípios, Deputado Luiz Martins, estão submetidos a duras regras em relação às suas dívidas. Também estão submetidos à lei de responsabilidade fiscal, mas a União, não.

A União subsidia as grandes empresas, via BNDES, com juros baixíssimos nos seus empréstimos e pratica extorsão quanto aos estados e municípios, principalmente, em relação ao contribuinte que no mercado bancário toma empréstimos a juros mensais escorchantes. Então, o problema da renegociação da dívida está dentro do pacto federativo.

Ontem, falava aqui sob essa ave de mau agouro, que é a nova partilha que querem fazer com o royalty e a participação especial. O que vai ferir, em especial, se essa lei for sancionada e o Veto ao artigo for derrubado? Vai ferir o quê? Vai ferir, em primeiro lugar, o pacto federativo. Então, essas discussões estão dentro da discussão do pacto federativo. Esse tema não pode passar ao largo da Assembleia Legislativa.

Outra questão é o fundo de participação do Estado, no qual o nosso índice é ridículo. Com a Constituição de 88, na medida em que passamos a receber royalties, a União congelou o índice do FPE. Hoje, nós somos o segundo estado brasileiro que mais contribui com impostos para a União. Somos um daqueles que menos recebe. O Supremo Tribunal Federal já decidiu sobre essa questão, que o FPE também tem que ser revisto. Esta é outra ponta do Pacto Federativo, afinal, somos ou não uma República? Mesmo na questão do serviço da dívida e da LRF, o indicador do Estado para tomar empréstimos, o multiplicador em relação às suas receitas, chega a 2, enquanto o dos municípios é 1,2. É claro que toda essa renegociação pode estar subordinada, que toda essa folga de Caixa que vier seja alocada em investimentos para que dê retorno imediato à nossa população.

Sr. Presidente, li hoje no jornal O Globo uma notícia quase cômica. O Governo Federal, no Congresso Nacional, que está revolto, não conseguiu chegar a um consenso sobre se deve ou não ter bebidas nos jogos da Copa do Mundo; foram várias contradições, ora podia, ora não podia. A solução genial foi delegar aos Estados resolver essa questão, como se a Copa do Mundo pudesse ser repartida entre as unidades federativas. Imaginemos: no Rio de Janeiro não vai poder, mas quiçá em Minas Gerais possa. Isso é a União a fugir de suas responsabilidades.

O Governador Sérgio Cabral, hoje, também no jornal O Globo, noticia que vai enviar a esta Casa um Projeto de Lei permitindo a venda de bebidas alcoólicas nos estádios durante a Copa de 2014.

Sr. Presidente, informo à Mesa Diretora e a V.Exa. que em 20/12/2011 apresentei o Projeto de Lei nº 1181/2011 que proíbe a venda e o consumo de bebidas alcoólicas nas dependências dos estádios de futebol no Estado do Rio de Janeiro. O §1º do Artigo 1º diz: “É válido inclusive para a Copa do Mundo de 2014”.

Assim, aviso à Mesa Diretora que, quando o Governador enviar um projeto contrário ao meu, os dois devem ser discutidos juntos porque, repito, dei entrada no meu em 20/12/2011. Tem sido prática nesta Casa, quando o Governador envia um projeto sobre tema igual ao de um projeto apresentado por um Deputado, não considerar o projeto do Parlamentar. Junta tudo, discute tudo junto. Na verdade deveria ocorrer o contrário, o projeto do Governador ser anexado ao projeto do Deputado, caso este tenha sido apresentado primeiro. Aqui é o Poder Legislativo, e não o Poder Executivo. Por isso, comunico previamente para que depois não digam que não sabiam que eu tinha um projeto a esse respeito. Tenho, sim, e proibindo a venda de bebidas alcoólicas nos estádios, principalmente durante a Copa do Mundo de 2014.

Muito obrigado.”

 

Veja abaixo o artigo de José Serra

Estados e municípios sob extorsão

A redução da taxa de juros básica, a Selic, prevista para 9% ao ano, evidencia a extorsão a que estão submetidos Estados e municípios em razão dos contratos firmados com o governo federal no final dos anos 1990. A não correção de distorções posteriores, causadas por mudanças na economia, levou a uma situação injusta e a um equívoco econômico, e sua retificação não aumentaria a dívida pública consolidada nem comprometeria a boa gestão fiscal, permitindo ainda a elevação da taxa de investimento público, cujo baixo nível traz danos imensos ao nosso desenvolvimento.

Esses contratos representaram uma corajosa inovação do governo FHC. A irresponsabilidade fiscal e os juros altos tinham levado Estados e alguns municípios a uma situação de pré-insolvência. Por isso mesmo se aprovou, em 1997, uma lei de refinanciamento de dívidas estaduais, logo estendida a 180 municípios. Houve uma grande operação de troca de ativos e emissão de dívidas pelo Tesouro Nacional, que refinanciou as dívidas estaduais e municipais com encargos financeiros então subsidiados e prazo de pagamento em até 30 anos.

A fim de que a situação não se repetisse, aos Estados e municípios foram proibidas a emissão de títulos de dívida mobiliária e operações de crédito antecipando receitas orçamentárias. A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), de 2000, deu o contorno final ao novo estilo no manejo nas finanças públicas estaduais e municipais, que ao longo dos tempo foi mostrando mais qualidade do que o próprio manejo federal. O sucesso foi tal que governos estaduais e prefeituras passaram a ser os principais responsáveis pelo aumento do superávit primário do setor público consolidado. Recentemente, a imprensa internacional comentou que essa experiência brasileira é um modelo para a União Europeia em crise. Teria razão caso fosse a Europa uma República federativa…

É pouco sabido que LRF não se aplica em sua plenitude às finanças federais. Isso depende de resolução do Senado, de iniciativa do Executivo, que nada fez. Por que os arautos da boa política fiscal ou da transformação do Banco Central no quarto Poder da República nunca chamam a atenção para essa falha? Um mistério. Além disso, desfrutando amplos graus de liberdade, o governo federal executa um orçamento paralelo (via vultosos restos a pagar de orçamentos anteriores e créditos subsidiados do BNDES ao setor privado) e para fechar números do déficit antecipa dividendos e tributos de bancos e empresas estatais (e não estatais) e até receitas, transformando barris de petróleo ainda no pré-sal em transferências da Petrobrás ao Tesouro.

Voltando à lei de 1997: o indexador dos contratos de refinanciamento a Estados e municípios foi o Índice Geral de Preços da Fundação Getúlio Vargas, o IGP-DI. A taxa de juros foi fixada entre 6% e 9% acima do índice, dependendo da amortização extraordinária do saldo devedor. Na época, os juros reais chegavam a 15%, daí o subsídio. No Congresso foi introduzido um teto para o pagamento anual dos serviços da dívida, de 13% das receitas orçamentárias líquidas.

O IGP-DI acabou sendo um índice ruim, demasiado dependente de choques cambiais e preços de commodities. Apesar do advento do regime de câmbio flutuante, o governo manteve-o como superindexador das dívidas estaduais e municipais. E as taxas de juros, encavaladas nessa supercorreção, tornaram-se altas demais: até cinco ou seis pontos acima da Selic. Enquanto cobra 14% ou mais das prefeituras e 12,5% de alguns Estados, o governo empresta a grandes grupos privados, via BNDES, a juros de 4% a 5%.

Em 2010 o serviço da dívida dos Estados foi de R$ 29 bilhões, equivalentes a 62% do seu investimento total. Paga-se bastante, mas, mesmo assim, o principal vem aumentando, como é o caso da capital paulista, cuja dívida cresceu cerca de cinco vezes entre 2000-2011, apesar do pagamento de R$ 16 bilhões! Se, em vez do IGP mais 9%, a dívida da cidade acompanhasse a Selic, os encargos acumulados em 2011 seriam R$ 17 bilhões menores!

Os diagnósticos sobre essa perversidade são numerosos e quase consensuais. Uma das propostas é óbvia: atrelar retroativamente as dívidas à Selic. Há, além disso, uma medida simples e fácil: permitir que a relação dívida/receita corrente líquida dos municípios seja a mesma dos Estados, ou seja, 2, em vez de 1,2, como é hoje.

Mas, afinal, por que nada tem sido feito de prático para eliminar essa perversidade? Um fator é a possibilidade de decisões discricionárias, dando-se autorizações especiais para este ou aquele captar créditos ou até receber contribuições fiscais diretas. Prática nada republicana, para usar termo em moda.

Há, porém, um erro mais importante em curso: a ideia de que todos os problemas federativos – dívida, royalties, Fundo de Participação dos Estados, guerra fiscal predatória – deveriam ser resolvidos simultaneamente num grande pacto! Bela fórmula para o imobilismo, lamentações, discursos triviais e comissões de alto nível. A estratégia correta é a oposta: resolver um problema de cada vez, sem excluir possíveis compensações localizadas transitórias, começando pelo mais fácil, que é o das dívidas – a ponta do barbante para desatar o novelo federativo.

Se isso for equacionado, os Estados e municípios teriam acesso a mais recursos. Mas deveria exigir-se, formalmente, uma contrapartida, que tudo fosse destinado a investimentos. Ao contrário do folclore, as esferas estaduais e municipais, na média, são mais ágeis do que a federal para investir. Já dão conta, aliás, de uns dois terços do total dos investimentos governamentais no Brasil (excluindo empresas). O efeito seria altamente positivo num país onde tais investimentos, como fração do produto interno bruto (PIB), são dos menores do mundo – uns cinco pontos porcentuais abaixo da média no restante da América Latina.

*EX-GOVERNADOR E EX-PREFEITO DE SÃO PAULO